A alimentação das crianças

A alimentação das crianças

Não é de hoje que a alimentação infantil é tema recorrente nas conversas entre mães, pais e pediatras. Muito comum é encontrar famílias inteiras mobilizadas para “fazer o fulaninho comer” quando a criança é daquelas resistentes a experimentar alimentos ou simplesmente é daquele tipo que “sobrevive” com uma quantidade de suprimentos que, para os adultos, seria impossível manter alguém vivo. Comum também é ouvir comentários sobre  a palidez, a estatura e outras características físicas da criança, vinculando-as ao cardápio ou às quantidades ingeridas. São frases do tipo: “Mas o fulano só come ovo; ou o beltrano só toma mamadeira até hoje”; e ainda, “esse menino não cresce porque não come”.

Por outro lado há os mais glutões. Menininhos e menininhas que parecem nunca estarem satisfeitos com o que comem. Consomem, em grandes quantidades, tudo que lhes é oferecido e, no pior dos casos, comem apenas doces e fastfoods e, por isso mesmo, despertam comentários bastante perversos além dos inúmeros apelidos que, com certeza, não serão esquecidos, mesmo quando forem adultos.

Mas o que fazer quando se tem uma criança que recusa-se a alimentar ou parece não ter limite para nenhum alimento? Tarefa complexa, mas que pode e deve ser encarada com cuidado, conhecimento e amor. E amor, nesse caso, vem acompanhado de uma visão de futuro. Futuro de uma criança que será um adolescente, um adulto e mais adiante um idoso. Exagero? Sentimentalismo? Drama? Definitivamente, não é!

Fui mãe de uma criança alérgica e, muito cedo, minhas convicções sobre os alimentos “certos” que uma criança deveria consumir caíram por terra. Aos 4 meses de vida, as orientações médicas eram no sentido contrário daquelas que me foram ensinadas pela mídia, pelo senso comum, pela literatura especializada que li para me preparar para ser uma boa mãe e pelas inúmeras crianças que vi sendo criadas perto de mim. Ao ter um filho com algum tipo de restrição alimentar, a primeira tentativa é fazer o mais certo possível o que o profissional que acompanha o caso propõe. Foi exatamente isso que fiz, mas, nem por isso deixei de ouvir comentários do tipo: “Que pena que sua filha não pode comer isso ou aquilo”; “Será que ela tem alergia mesmo?”; “Chiii…. criança que não toma leite é muito complicado. Leite é o alimento certo para toda criança.”

Ouvi de tudo. E, além da alergia, minha filha era do “modelo mais econômico”, ou seja, com pouca quantidade de qualquer alimento, a danadinha estava satisfeita. Nunca ouvi aquele barulhinho de ar, sendo sugado da mamadeira, até o final do suco ou da vitamina. Ela sempre me entregava a mamadeira ou a tigelinha de fruta  e biscoito, com alguma sobra. E  até hoje, já adulta, suas quantidades são bem comedidas. Tive que aprender a respeitar seu organismo. E como foi bom aprender isso: cada um funciona de um jeito!

Como pedagoga e professora de educação infantil por quase 20 anos, tive a oportunidade de presenciar várias experiências envolvendo famílias, alimentação e muitas situações engraçadas. Recordo-me de um aluno muito esperto, inteligente, mas bem complicado para se alimentar, principalmente no quesito quantidade – ele era dos que comiam pouco e mal. No seu aniversário, a mãe havia combinado de enviar alguns salgadinhos para todos os colegas da turma, na hora do lanche. Quando a bandeja chegou à sala, repleta de pasteis, eu o chamei e mostrei o que a sua mãe havia trazido. E ele, do alto dos seus 6 anos, olhou aquela bandeja lotada e falou, passando a mãozinha na barriga e franzindo a testa: “Ai, ai, eu não vou dar conta de comer tudo isso não.” Mais um aprendizado: criança tira conclusões imediatas, ainda está aprendendo a fazer deduções, conclusões e planejamentos, ou seja, suas condições são ainda limitadas e por isso, precisa de um adulto mediando suas escolhas, ponderando, ensinando-lhe a pensar sobre tudo, inclusive sobre alimentação.

Hoje, trabalhando com alimentação saudável e unindo os anos dedicados à educação, minha observação e experiências apontam para duas conclusões: são necessários bons exemplos e estímulos em todos os sentidos na vida das crianças. No esporte, na cultura, na alimentação, na convivência, na cidadania, enfim, em tudo!

A outra conclusão refere-se ao equilíbrio. Uma criança que convive com adultos que se esforçam para oferecer-lhe uma vida equilibrada, certamente terá noções de que não é possível ter tudo o que se quer, bem como comer apenas o que se tem vontade, a qualquer hora, em qualquer lugar e em qualquer quantidade.
No artigo muito bem escrito pelas nutricionistas Bruna Z. B. Santos, Tamires Rios e Vanessa Nagaishi, “Comportamento alimentar infantil”, postado no site www.fsp.usp.br, há uma série de dicas sobre como os pais podem lidar com a alimentação das crianças. Dentre as sugestões, as autoras destacam o respeito ao horário das refeições, a variedade na oferta dos alimentos e o cuidado de não utilizar a comida como recompensa ou moeda de troca. Vale a pena a leitura do texto na íntegra.

Em resumo, numa era em que temos tido acesso a tanta informação, cabe a cada um, coragem e consciência para assumir posturas mais concretas, com o propósito de ter mais qualidade de vida, mais saúde para si mesmo e para os pequenos que estão sob nossa responsabilidade. Afinal, eles não serão crianças para sempre e a vida adulta chegando, vai agradecer. Então, mãos à obra papais e mamães!

Marise Alencar é pedagoga, mestre em educação, culinarista e proprietária da Seletiva Comida Saudável.

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